O TRIBUNAL DE CONTAS
E OS TESTEMUNHOS DA ESCRAVATURA
 

Em junho apresentamos dois documentos do Livro de representações da Capitania de São Paulo (anos 1803-1807).

Os Livros de Representações apresentadas ao Erário Régio são uma valiosa fonte de informação por revelarem diversos aspetos da situação económica e social vivida nas capitanias do Brasil.

Nos dois documentos selecionados são revelados, entre outros assuntos, a mortalidade provocada pelos surtos de varíola na população escrava da capitania de São Paulo.
 


 

1804-03-03 - O primeiro documento diz respeito à Representação apresentada pelo governador da capitania de São Paulo, em ofício de 18 de fevereiro de 1803, relativa ao projeto de instalação dos Armazéns de Sal e da Alfândega de Santos no colégio que pertencera aos jesuítas e mencionado o impacto dos surtos de varíola na população da capitania, nomeadamente a “perda da escravatura.”

É apresentada a situação causada pela doença das bexigas (varíola) e outras pestes que grassaram pela capitania em governações antecedentes, em que foi necessário acudir a todo o tipo de pessoas abandonadas, e da qual resultou grande mortalidade e número elevado de infetados na população escrava, contabilizando-se a perda da escravatura em 25 mil cruzados.

Arquivo Histórico do Tribunal de Contas. Erário Régio, 4063 – Livro de representações respeitantes à capitania de S. Paulo 1803-1807. Fls. 7-10.

     

1804-03-06 - O segundo documento diz respeito à Representação apresentada pelo governador da capitania de São Paulo, em oficio de 19 de fevereiro de 1803, relativa ao projeto de recuperação da agricultura e comércio, propondo medidas que facilitassem a “entrada de escravatura” na capitania.

Expõe o governador que na capitania “por falta de indústria, se faz a lavoura, e toda a casta de trabalho à força de escravos”. Ao atual estado de indigência da capitania, acresce a grande ruina de parte dos lavradores, devido às duas epidemias de bexigas (que causaram a morte dos escravos) e à falta de recursos para poderem comprar no mercado do Rio de Janeiro novos escravos.

Poderia restabelecer-se a agricultura e o comércio se houvesse facilidade na entrada da escravatura diretamente na capitania (como se permitiu ao Pará que os isentou dos direitos por dez anos), e a entrada de famílias das Ilhas, com o fim de povoarem a Marinha e puderem ensinar a trabalhar e cultivar, “pois que o limitado trabalho de poucos escravos não pode animar a agricultura”.

Arquivo Histórico do Tribunal de Contas. Erário Régio, 4063 - Livro de representações respeitantes à capitania de S. Paulo. 1803-1807. Fls.14-16.